
В Португалії вийшла друком антологія українських віршів під назвою "ESTE MUNDO É UM VERTEP" або ж "Весь світ - вертеп".
До антології включено 157 віршів 43-х авторів. Всі переклади здійснено Аною Мартінс (Ana Martins). Аби представити португальському читачеві українську поетичну традицію упорядниці - Наталія Цісар і Ана Мартінс - вирішили вірші поетів дуже різних епох: від початку XX і аж до XXI століття.
Або, умовно кажучи, від Павла Тичини і Гео Шкурупія до Ірини Цілик та Вікторії Амеліної.
Є в цій антології і переклади Василя Стуса, окремі вірші якого досі на португальську переклала в Бразилії Віра Вовк.
MÚMIA Мумія
1
Tem uma cabeça repleta de memórias. (A eterna moagem de uma verdade: caretas de maldade, da maldade da maldade, da maldade da maldade da maldade). E com uma boca de velho mostra lascivamente: aquilo que foi o ano de 1968 da nova era reflecte, como na água morta, os eventos de 1968 ainda antes de Cristo. Move-se, perscrutando a água clara. Aproximou-se viu compreendeu compreendeu viu aproximou-se. Compreenderá já tudo, aproximou-se viu, nem as convulsões compreenderam, mas — confirme-se: a certidão de óbito, a reanimação ao nível do nascimento, a democracia dos cemitérios. Não há necessidade para os olhos. Não há necessidade para os pés. Não há necessidade para as mãos. Os esforços são inúteis. E a cabeça é fútil em ombros rudimentares. O tsar da natureza — a coroa dela — cresce — logo diminui.

2
O passeio é medicinal. A recuperação — uma auto-perda. O amadurecimento — a destruição. O cúmulo — uma loucura. Composição de muitas cabeças sobrepostas umas às outras. (a primeira dorme, a segunda dorme, a terceira — dorme, a quarta, a quinta — até ao infinito! — dorme) A do topo tem o panorama do sono.
3
Atiras uma pedra — círculos idênticos dispersam-se. Apanhas os círculos — e estes correm de novo ao encontro, criam algo que se assemelha a uma mola comprimida. Removes a pedra — obscurece o próprio buraco. 1971
Não tenho forma alguma de crescer até ao fim, E não tenho forças para travar o crescimento… Posso tudo — Florir na Primavera, Como a terra Jovem e ressuscitada, Posso Travar um rio, Prolongar a vida Ou encurtá-la — sou capaz de tudo! Posso medir a profundidade do céu, Como se medem os torsos com balas. Conhecer o desconhecido, Para depois Enterrá-lo para todo o sempre… Deram-me pela vida a imortalidade e a juventude eterna. Cresci. Da terra. E filho da terra, Não posso travar. E a mim ninguém me consegue travar. Todos os dias Ouço como me doem Os meus dons e feitos, A cada momento Ouço — de repente rasgar-se-me-á o peito, E saltará de lá o coração como um homúnculo, Que gozará contigo: — Que Fizeste tu de bom na vida? Não transformei, Deformei A grande terra, Símil do coração humano. Palpita ela Nas minhas mãos Abertas No mundo sem fim… O meu olhar Enegrece, E escurece O meu céu perplexo Não tenho forma alguma De crescer até ao fim, Não posso confirmar A minha natureza Com o grande amor, Para sentir O batimento do magma terrestre. Ó minha terra natal! Eu cresço! Eu elevo-me! Poderei Proteger-te! O jardim outonal Sacode as suas estrelas… E então Transparecido De amor e de bondade, Lavrarei a terra Para as nascentes azuis. 1965

À memória de M. K. Zerov // Пам'яті М.К.Зерова
As rodas batem surdamente, como ondas num navio, confronta, camarada Caronte, o mal e o bem.
As rodas batem, as rodas batem algures abrindo o caminho. Agora. Não voltarão a casa, não voltarão a casa. As rodas batem surdamente, as rodas batem em cristo, no grande líder, em todos os ídolos, e até na puta que os pariu, Moscovo, o monte Vedmeja, a ilha Kem e Popiv são o caminho para trás das grades, para os grilhões, alagado de lágrimas… E logo de novo Vyatka, Kotlas, Ust- Vym e até mais adiante, até Chybyo. A união dos campos de concentração socialistas soviéticos que deus esqueceu e da qual nem o diabo se lembra, agora manda aqui um outro deus: marxista, racista e canibal — um por três. Moscovo — Chybyo, Moscovo — Chybyo, o campo de Pechorskyi erige um novo dia em cima de ossos e sangue. 1970

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Junto à estação de metro Khreshchatyk pára todas as manhãs um carrinho de bebé. A varredora elege das urnas de ferro fundido o lixo despejado: velhos jornais, trapos velhos, caixas de fósforo, pontas de cigarro, leva-os no carrinho e afasta-se ao longo do parque de castanheiros.
Mas hoje, véspera de feriado, ela escolheu a mais bela saia de cetim, uma fufaika e uns botins, enfeitando até o carrinho com umas flores de espuma. O sorriso e o sonho no rosto recriam o equilíbrio da felicidade. 1971
No primeiro andar — duas pessoas no segundo — as suas sombras. Um técnico qualificado liga o quadro de tal forma que já não percebes onde estão pessoas e onde há apenas sombras. Lá em baixo declaram: contigo viverei em amor e felicidade. Em cima repetem: tivesse eu uma faca — cortava-te que nem um cão. Depois entra em cena um terceiro e começa a pregar ao céu que cresce cresce cada vez mais alto. Um feixe de luz ascende ao vazio-celeste do firmamento, onde se ouvem cantos angelicais: “ferve um em manteiga, o outro em resina”. Por fim, começam as danças: o diabo salta para o primeiro plano e começa aos pinotes. Ora se ergue nas pernas, ora se sustém nas mãos, e vira-se e revira-se até as mãos chegarem à terra e as pernas se suspenderem no ar. E torna-se claro para todos que o que gira é apenas o tronco. 1971

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Esta peça começou já há muito tempo, mas só agora percebi: é uma peça a que todos assistem, destituídos da própria presença, e em que participam todos. Não vivem. A mim calhou-me o papel mais feliz desta peça desconhecida, da qual nem uma única palavra sei (um terrível segredo). O actor também se mantém incógnito. Os actores se os há ou não — não sei. Monólogo? Mas sem palavras? Porque os gestos falam incertos. E é isto sonho ou realidade? Ou a imaginação quimérica da cabala? Ou só uma ilusão? Observo desatentamente o que o nosso ponto surdo-mudo expressa por mímicas. Não compreendo: quero ficar — ele ordena-me: vai, começo a ir — obriga-me a ficar, olho para o horizonte encenado — manda-me fechar os olhos. Aperto-os — ele: observa o teu futuro radiante. Sento-me — diz: levanta-te. Confuso, decido: o papel mais feliz calhou a um outro. Tu representas como um louco. E entro de uma vez no papel, representando ao contrário. Era para rir —choro. O peito incha de raiva (um pequeno exagero: os lunáticos são sempre emocionalmente equilibrados) — mas eu alegro-me. Passa um carro funerário, deleito-me. Entrando numa carroça, passo-me: que se glorifique a vida. O ponto entusiasmado não se surpreende e apenas encoraja: bravo. As cadeiras rangem na sala vazia, os únicos espectadores desta peça observam através de mim sabiamente o vazio que lhes é apenas a eles visível. E a cabeça dói tanto. E tão insuportavelmente brilha o projector na caligem, quase como se a sala escura se convertesse num feixe de fogo do inferno. O ponto ordena finalmente que se pare. E eu corro disparado para a sala. E pronto. Terminou. A peça desvaneceu-se. Caiu o pano. Já não sou actor —espectador. Estendem-se enfileirados pela sala tantos mortos-vivos, velhos actores, chamuscados pelo fogo louco da ribalta. E todos eles me estendem as mãos vidradas: — Ó, Yorick felizardo! aqui o teu número é o cento e trinta e cinco. Procura com ele a almofada, o colchão e o cobertor. E podes descansar o quanto quiseres. O tempo aqui está em suspenso. Aqui os anos não passam. Porque aqui a vida tem um fim interrompido, como a peça. Tem apenas início. E um fim - que não há. — Como se chama a peça?

— Yorick, o felizardo. — Ou seja, sou o herói, como se diz, o papel principal? — Foste o herói, Agora acabou-se. Outrora também nós f o m o s. — E que tipo de peça é? — Uma versão bem-sucedida do já há muito esquecido Shakespeare, escrita por um glorioso dramaturgo, — E qual é o seu apelido? — Não temos apelido. — Mas como assim? — Só têm nome aqueles que existem. — E vocês? — Nós somos todos igualmente felizardos! — E o Yorick — um louco?
— Não. Um felizardo. Felizardo? Como? Eu fiz o papel de idiota. — E o que te espanta? Idiota ou inteligente ou genial tanto faz, feliz ou infeliz é igual – são palavras vazias que se regem apenas pela diferenciação. Mas aqui não há diferenciações de géneros. Porque todos nós somos actor ou espectador. E vai tudo dar ao mesmo. Porque o espectador também tem de fazer de espectador, e fá-lo — com gosto. Não temos qualquer nome. Hoje és o Yorick, e amanhã és já n i n g u é m. Aguardas por um papel e será ele que te dará o nome, e sempre assim até à morte. Uma vez — Yorick, e para o resto da vida — ninguém. Não tens rosto nem nome. Mas vá, representa a maçadora vida sussurrada de um estranho — reproduz apenas a repetição. E vivendo assim o papel até à morte, decora as palavras já esquecidas: luta, povo, amor, inimputabilidade, traição, decência, honestidade… Tantas palavras inventadas pelos antepassados. Meu Deus — a vida por dinheiro, mas tantas palavras: e todas elas são estranhas e desconhecidas. Vá, digamos, chamamo-nos obreiros, e não perguntes o que é isso de obreiros. — Vocês produziram obra? — E o que é isso de produzir? Assim vos chamam, obreiros e pronto. Somos a isso indiferentes. Talvez te importe que o verdadeiro Yorick não seja de todo o Yorick. E talvez nem por uma vez se tenha assim chamado. Lembras-te? Nas mãos de Hamlet caiu só o crânio — sem olhos, sem lábios, sem nariz e sem orelhas — foi-se tudo por completo, simplesmente assim, como connosco. Usa o nome que quiseres. Aqui tudo é indiferente: o herói, o actor, o espectador, o ponto e o autor — todos vivem a vida de outrem: de dia — a peça, sempre a mesma e sempre igual, ainda que sempre desconhecida, pois a espera é também uma actriz que faz de esperança e consegue outrar o mundo inteiro. E à noite — sempre o mesmo. O actor habituou-se já ao sossego. Até ao crepúsculo esconde-se debaixo do cobertor como um caracol na sua casca. Digamos que é aquele que murmura para si algumas falas do papel que tem sob o nariz (vozeia o silêncio e o gesto mortal), e aquele é o que dá as gargalhadas — um eco esvoaça pela sala de concertos. Um terceiro dorme, e chora ainda um quarto. O quinto — fixa o olhar no tecto — e cala-se, cala-se, cala-se. Havia ainda um outro — rezava. Ao que sei, era de entre nós o mais velho, passou mesmo por três pontos (que vivem pouco). Até que se enforcou. Devido ao tédio, é o que dizem os nossos actores, embora nunca tenhamos falado sobre o assunto. — E porquê? — E para quê falar? Dá-se à língua em vão. Ainda há quem ouça e transmita ao ponto. Pois nós temos de ser felizes até à morte. É a nossa primeira obrigação. Certo dia visitou-nos o mais importante ponto. Trouxe um grande conselho e ouviu-nos a todos. E nós em pé a agradecer em coro. — Então, e ele? — Observou-nos e espremeu tudo de nós. Quem interpretasse feliz a felicidade — para a esquerda, para a direita — quem era infeliz. Porque o pecador é quem sofre e o justo — quem é feliz. Enfim, as coisas são assim. E levam logo os carrancudos para algum lado. Dizem que para a escola da felicidade. Mas de lá ainda nenhum voltou. Bem, adeus, que amanhã, lembrou-me o ponto, tenho de mostrar felicidade por três horas, por quatro — raiva, e para o resto do dia — amor e devoção. Por isso, há que descansar. E deixado à minha sorte dou por mim a pensar que apenas o movimento é o único a mudar — e já não se reconhece então nem fim nem início, porque tudo se transforma. O mundo sustem-se em movimentos aleatórios que o expressam. A escuridão lançou os dados com tacto. Os actores gemiam surdamente no sono, e pelo olho de Polifema lá no topo brilhava a lua vermelha sem língua. Esperei algo até de manhã. A noite? A vida? Ou será que o fim da eternidade? Até que finalmente ligaram o interruptor do dia e penduraram o sol num guindaste e na abóbada celeste surgiram dois actores que cantaram em dueto em vez das cotovias. Do laboratório levou-se uma amostra de orvalho. E pendurou-se um letreiro: “Vá, ao trabalho, começou o dia”. O ponto mete-se no alçapão, e começa a peça, não terminando mais. 1971

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Extingue-se no monte Lysa a fogueira nocturna quando no monte Lysa se extingue a folhagem do Outono e até já me esqueci onde fica o monte Lysa e nem sei se o monte Lysa me poderia ainda reconhecer. Meados de Outubro — época dos teus crepúsculos, das tuas desconfianças e descrenças e do vento outonal. E metade da vida foi esquecida. E esquecido o pecado. A desgraça e a felicidade agora sem malícia. Meados de Outubro — e das tuas despedidas a voz aguda, e já não sei eu, não sei, não sei, não sei se morri, se ainda vivo ou se morro de viver, pois já se desbotou, desflorou, desventurou, desvaneceu tudo em redor. Mas ainda se sente o cheiro das tuas saudosas palmas das mãos, e o cheiro dos teus lábios salgados e amargos, e voa o monte Lysa nas asas de um pássaro assustado, e surdamente, em aortas inchadas, arrulham as pombas em esforço. 1971

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Caronte disse severamente: não! A barca desancorou. Uma nuvem De asas negras aproxima-se do Ténaro. Queimada no fogo da noite. Ouço no trovão
O toque alarmante de uma cítara… Talvez não combine contigo a morte, Uma morte vergonhosa em terra estrangeira. Talvez não quando ruge um trovão Na enseada. E chuva. E granizo. E libertam-se os cavalos selados Das cavernas. De volta. Aos mundos. E surgem fantasmas sombrios. Lá longe, na meta. Ainda vale a vida quando as tempestades Adornam de verde as nuvens de ouro. 1959
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No início mataram a pessoa, // "Спочатку вони вбивали людину..." depois reavivaram o morto. Procederam à reanimação Em gabinetes cosméticos (pintores — em vez de médicos). Por casos como este deram a vida dinastias inteiras de mestres do pincel. Até que fosse impossível distinguir o vivo do morto. 1971
StusCenter щиру дяку перекладачці Ані Мартінс (Ana Martins) за цю велику роботу, адже португаломовний читач зможе більш широко познайомитися з віршами Василя Стуса періоду "Зимових дерев" і "Веселого цвинтаря".
Твори цих збірок легше віддавати європейськими мовами, в яких значно скромніші за наші можливості силаботоніки. Хочеться вірити, що колись надійде час і до перекладів вершинної книги Стуса - корпусу збірки "Палімпсести", твори якого (у відносно значних об'ємах) поки перекладені польською, російською та французькою мовами.